Noites do meu pampa, estrelas nuas
Que me vêm como sonâmbula vagar
Esperando me elevar à luz da lua
Pequena e branca gôndola no ar!
Me conhecem os peões e suas prendas,
Esta “louca de Albano”, desvairada,
Que sai de sua cama “toda em rendas”
Para andar no jardim, de madrugada,
Pois que não resisto aos seus apelos
Noites e luas magistrais desta planura
Que me puxam no leito os cabelos
E que, antigos, meus delírios alimentam
(sou eu a lenda viva que comentam)
Na sutil voragem branca de loucura...
27/02/2004
sexta-feira, 9 de outubro de 2009
A Candeia (de Alma Welt)
Sob a luz aconchegante da candeia
Que tremula viva qual carícia,
Sou como a aranha em minha teia
Embora espere idéias sem malícia,
E nunca como presas, sem piedade,
Mas aquelas que vierem por encanto
Que é como nascem de verdade
Os poemas, o riso e mesmo o pranto.
E começo por pensar a natureza
Dessa luz tão doce e aliciante
Que aqui no casarão é ainda acesa.
E se, poeta, queimo velas e pestanas
É que percebo que a chama leva adiante
A vigília do Tempo em filigranas...
19/08/2005
Que tremula viva qual carícia,
Sou como a aranha em minha teia
Embora espere idéias sem malícia,
E nunca como presas, sem piedade,
Mas aquelas que vierem por encanto
Que é como nascem de verdade
Os poemas, o riso e mesmo o pranto.
E começo por pensar a natureza
Dessa luz tão doce e aliciante
Que aqui no casarão é ainda acesa.
E se, poeta, queimo velas e pestanas
É que percebo que a chama leva adiante
A vigília do Tempo em filigranas...
19/08/2005
A estirpe dos Sonhos (de Alma Welt
Os seres que povoam nossos sonhos
Pertencem a estirpes muito antigas.
Não sabemos o que os põe tristonhos
E o que os alegra em risos e cantigas.
Em mim os vejo sempre em algo misto
De uma Arcádia bucólica e um Walhalla
Onde ali no bosque ou cá na sala
Erguem brindes de honra ao mais bem-quisto.
Mas sei que o festejado é Dioniso
E não um guerreiro, e meu espanto
É que Orfeu ao lado jaz e eu o diviso
Na forma de um cisne apaixonado
Que no último momento lança um canto
E trai em arte seu amor desesperado.
Pertencem a estirpes muito antigas.
Não sabemos o que os põe tristonhos
E o que os alegra em risos e cantigas.
Em mim os vejo sempre em algo misto
De uma Arcádia bucólica e um Walhalla
Onde ali no bosque ou cá na sala
Erguem brindes de honra ao mais bem-quisto.
Mas sei que o festejado é Dioniso
E não um guerreiro, e meu espanto
É que Orfeu ao lado jaz e eu o diviso
Na forma de um cisne apaixonado
Que no último momento lança um canto
E trai em arte seu amor desesperado.
Antípodas (de alma Welt)
Para ser a Alma mesma que me cabe
Devo cantar somente ou versejar
Acordar em ser e êxtase de amar
Para viver como se nada nunca acabe.
Todavia aquele espectro soturno
Teima em me seguir e acompanhar
Mesmo quando é dia e não seu turno,
Que é da noite seu tempo e seu lugar.
Mas eu sei que os polos se entrelaçam
E para um deles ser, o outro oponho,
Que sozinhos ambos doem e ameaçam.
E o mistério de viver nisto consiste:
Estar no mundo e saber que tudo é sonho,
O mundo é belo, e de verdade... nem existe.
Devo cantar somente ou versejar
Acordar em ser e êxtase de amar
Para viver como se nada nunca acabe.
Todavia aquele espectro soturno
Teima em me seguir e acompanhar
Mesmo quando é dia e não seu turno,
Que é da noite seu tempo e seu lugar.
Mas eu sei que os polos se entrelaçam
E para um deles ser, o outro oponho,
Que sozinhos ambos doem e ameaçam.
E o mistério de viver nisto consiste:
Estar no mundo e saber que tudo é sonho,
O mundo é belo, e de verdade... nem existe.
quinta-feira, 18 de junho de 2009
O cavalo de fogo (de Alma Welt)
Por aqui o cavalo vai sem meta
Todo em chamas a vagar na pradaria
E me lembro do outro, o do poeta
Lima que seu livro incrível lia.
E hesitamos, eu, Rodo e Galdério
Em segui-lo à distância pela noite
Pois seu rastro deixado como açoite
É como aquela luz de cemitério,
De santelmo, como dizem marinheiros
E o gaucho que se esvai em pleno pampa
O avista nos momentos derradeiros
Quando segurando o ventre rubro,
E da coxilha a galgar última rampa
Segue o íncubo cavalo que descubro...
(sem data)
Todo em chamas a vagar na pradaria
E me lembro do outro, o do poeta
Lima que seu livro incrível lia.
E hesitamos, eu, Rodo e Galdério
Em segui-lo à distância pela noite
Pois seu rastro deixado como açoite
É como aquela luz de cemitério,
De santelmo, como dizem marinheiros
E o gaucho que se esvai em pleno pampa
O avista nos momentos derradeiros
Quando segurando o ventre rubro,
E da coxilha a galgar última rampa
Segue o íncubo cavalo que descubro...
(sem data)
quarta-feira, 17 de junho de 2009
Memórias farroupilhas (de Alma Welt)
Pelas trilhas em volta do sobrado
Que se eleva sobranceiro na planície,
A fachada como a face de um barbado,
Com sua decantada esquisitice,
Recoberta pela hera e não grisalha
Conquanto mais vetusta que a do Vati,
E que sobe a parede até a calha
Com sua textura cor de mate,
Eu perambulo nos dias e nas noites
Procurando senhas e vestígios
Dos antigos farrapos e prodígios
Que me são anunciados por murmúrios,
Gemidos de cilícios, seus açoites,
Os vôos da memória e seus augúrios...
17/11/2006
Que se eleva sobranceiro na planície,
A fachada como a face de um barbado,
Com sua decantada esquisitice,
Recoberta pela hera e não grisalha
Conquanto mais vetusta que a do Vati,
E que sobe a parede até a calha
Com sua textura cor de mate,
Eu perambulo nos dias e nas noites
Procurando senhas e vestígios
Dos antigos farrapos e prodígios
Que me são anunciados por murmúrios,
Gemidos de cilícios, seus açoites,
Os vôos da memória e seus augúrios...
17/11/2006
O haragano e o minuano (de Alma Welt)
O haragano é uma força deste prado,
Irrupção vital e alegre vento
Como fora verão, sem o tormento
Do nosso minuano, o outro lado
Do pampa quando mostra seu semblante,
Gélida, implacável e feia cara...
É então que ess’ outra face nos prepara
Para o longo inverno, duro amante.
E então acolhemos o monarca
E não o usurpador, embora feio,
Com nossos grossos palas e o mateio.
Mas, bah! quando ao açoite a nave geme,
No salão deste sobrado e minha arca
Lanço versos qual se ainda houvesse leme.
09/04/2004
Irrupção vital e alegre vento
Como fora verão, sem o tormento
Do nosso minuano, o outro lado
Do pampa quando mostra seu semblante,
Gélida, implacável e feia cara...
É então que ess’ outra face nos prepara
Para o longo inverno, duro amante.
E então acolhemos o monarca
E não o usurpador, embora feio,
Com nossos grossos palas e o mateio.
Mas, bah! quando ao açoite a nave geme,
No salão deste sobrado e minha arca
Lanço versos qual se ainda houvesse leme.
09/04/2004
Pássaros migrantes (de Alma Welt)
Pássaros migrantes do meu sonho!
Eu os avisto a voar em formação
A caminho do Norte e sua canção
Que conheço só do que disponho
De livros e poemas nas estantes
Desde que era a guria tão curiosa
Projetando vagar mundos distantes
Talvez como escritora já famosa...
Me alce, ó bando, e leve com você
Nesse vôo lindo em esquadrilha
Com formato sugestivo de um “V”
Do qual não almejo a liderança,
E humilde seguirei à maravilha
O sonho de que a Alma não se cansa...
(sem data)
Eu os avisto a voar em formação
A caminho do Norte e sua canção
Que conheço só do que disponho
De livros e poemas nas estantes
Desde que era a guria tão curiosa
Projetando vagar mundos distantes
Talvez como escritora já famosa...
Me alce, ó bando, e leve com você
Nesse vôo lindo em esquadrilha
Com formato sugestivo de um “V”
Do qual não almejo a liderança,
E humilde seguirei à maravilha
O sonho de que a Alma não se cansa...
(sem data)
sexta-feira, 24 de abril de 2009
A Noite do Maestro (de Alma Welt)
5
Noite perplexa, pálida e demente
A se estender da casa à pradaria
Desde o coração da minha gente
Concentrada no salão e escadaria,
Todos à roda do corpo tão presente
A que só eu via a grande espada
Entre as mãos no peito e repousada
Longitudinal e reluzente...
O maestro jazia inanimado
Mas a música de seus dedos se ouvia
A tocar num gravador ultrapassado,
Parecendo vir de longe, muito longe,
D’uma idade recheada de magia
Onde fora grão-senhor, guerreiro e monge...
03/01/2001
Noite perplexa, pálida e demente
A se estender da casa à pradaria
Desde o coração da minha gente
Concentrada no salão e escadaria,
Todos à roda do corpo tão presente
A que só eu via a grande espada
Entre as mãos no peito e repousada
Longitudinal e reluzente...
O maestro jazia inanimado
Mas a música de seus dedos se ouvia
A tocar num gravador ultrapassado,
Parecendo vir de longe, muito longe,
D’uma idade recheada de magia
Onde fora grão-senhor, guerreiro e monge...
03/01/2001
quarta-feira, 22 de abril de 2009
Noites abrasadas (de Alma Welt)
4
Noites abrasadas, tão frequëntes
De minha grande dor transfigurada,
Quando o vão clamor pelos ausentes
Deixava o meu rastro pela escada.
Madrugadas doridas entre os galos
E os latidos longínquos na estrada;
Os minutos escorrendo pelos ralos,
Dedos e passos percorrendo o nada.
Depois o som há muito ausente do piano
Negro e mudo, a vir do tétrico Steinway
Que o mestre dedilhava e tanto amei,
Agora que só tons graves se ouvem
Tangidos pelo intruso Minuano
Como arremedo surdo de um Beethoven...
06/01/2007
Noites abrasadas, tão frequëntes
De minha grande dor transfigurada,
Quando o vão clamor pelos ausentes
Deixava o meu rastro pela escada.
Madrugadas doridas entre os galos
E os latidos longínquos na estrada;
Os minutos escorrendo pelos ralos,
Dedos e passos percorrendo o nada.
Depois o som há muito ausente do piano
Negro e mudo, a vir do tétrico Steinway
Que o mestre dedilhava e tanto amei,
Agora que só tons graves se ouvem
Tangidos pelo intruso Minuano
Como arremedo surdo de um Beethoven...
06/01/2007
A Cavalhada (de Alma Welt)
3
A cavalhada vem durante o sono
E passa por mim em sobressalto,
Que desperto então em pleno Outono
Com as folhas varridas para o alto.
E corro, bah! eu corro desde então
Das minhas horas em fluxo contrário
Que buscam varrer-me para o chão
Com seu vento forte e arbitrário,
O Minuano, sim, se diz meu dono,
E me quer não como às folhas, mas mulher,
Eu que prefiro os cavalos do meu sono
Que brancos como ondas me seduzem
E no abismal galope me conduzem
Aos páramos profundos do meu ser...
10/03/2005
A cavalhada vem durante o sono
E passa por mim em sobressalto,
Que desperto então em pleno Outono
Com as folhas varridas para o alto.
E corro, bah! eu corro desde então
Das minhas horas em fluxo contrário
Que buscam varrer-me para o chão
Com seu vento forte e arbitrário,
O Minuano, sim, se diz meu dono,
E me quer não como às folhas, mas mulher,
Eu que prefiro os cavalos do meu sono
Que brancos como ondas me seduzem
E no abismal galope me conduzem
Aos páramos profundos do meu ser...
10/03/2005
Sob a figueira (de Alma Welt)
"O mundo de Alma Welt"-tela de Guilherme de Faria
Sob a figueira (de Alma Welt)
2
Sob a figueira em sonho estava ela,
A branca peregrina de uma noite,
Sentada de viés em sua sela
Os olhos a pedir que não me afoite.
E eu me aproximei arrepanhando
Minha longa saia de cetim
Com meus pés inseguros caminhando
Numa espécie sedosa de capim
Dourado, como a bruma que luzia
E envolvia tudo em doce flama
Que por si apaziguava e seduzia.
E eu ouvi a voz que se me canta,
E o coração, ao recordar, ainda inflama:
"Virás comigo em breve, Alma, Infanta."
O Gaucho Triste (de Alma Welt)
1
Vinha o gaucho ereto em sua sela,
Montado no vento e sem cavalo.
A noite carecia de uma vela
Que a lua era negra e sem um halo.
“Vai-te”, disse eu, “por quem me tomas?”
“Sou a prenda fiel de pai e irmão,
E não deixarei que escuras formas
Venham entreter meu coração!”
E o gaucho espectral continuava
Ali, com a face branca e triste,
E o zum de seu silêncio se arrastava.
Longos bigodes, chapéu de barbicacho,
No seu punho uma lâmina em riste,
A outra mão a cobrir o rubro facho...
05/02/2004
Nota
Acabo de descobrir um novo tesouro na Arca da Alma: um grosso maço de papel contendo sonetos manuscritos que pelo seu timbre e conteúdo resolvi entitular "Sonetos Delirantes da Alma".
A grande poetisa cultivava também uma vertente obscura e misteriosa, por vezes assustadora, na sua imaginação tão rica de mundos e timbres.
À medida que os for compilando e digitando, irei publicando numerados. Talvez tome a liberdade de entitulá-los, para efeito de melhor divulgação no Google, pois Alma não fez, nem sequer os numerou.
(Lucia Welt)
Vinha o gaucho ereto em sua sela,
Montado no vento e sem cavalo.
A noite carecia de uma vela
Que a lua era negra e sem um halo.
“Vai-te”, disse eu, “por quem me tomas?”
“Sou a prenda fiel de pai e irmão,
E não deixarei que escuras formas
Venham entreter meu coração!”
E o gaucho espectral continuava
Ali, com a face branca e triste,
E o zum de seu silêncio se arrastava.
Longos bigodes, chapéu de barbicacho,
No seu punho uma lâmina em riste,
A outra mão a cobrir o rubro facho...
05/02/2004
Nota
Acabo de descobrir um novo tesouro na Arca da Alma: um grosso maço de papel contendo sonetos manuscritos que pelo seu timbre e conteúdo resolvi entitular "Sonetos Delirantes da Alma".
A grande poetisa cultivava também uma vertente obscura e misteriosa, por vezes assustadora, na sua imaginação tão rica de mundos e timbres.
À medida que os for compilando e digitando, irei publicando numerados. Talvez tome a liberdade de entitulá-los, para efeito de melhor divulgação no Google, pois Alma não fez, nem sequer os numerou.
(Lucia Welt)
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